Quarta-feira, 15 de Fevereiro de 2006
PARA VOS AGUÇAR O APETITE!
Sobre o filme Munique uma crítica brasileira escreveu:
" Munique é o filme mais corajoso da carreira de Steven Spielberg. Se em Império do Sol, A Lista de Schindler e O Resgate do Soldado Ryan ele contou histórias que, ambientadas durante a Segunda Guerra Mundial, nos forneciam personagens e situações com as quais podíamos nos identificar facilmente, desta vez o cineasta faz questão de pisar em campo minado, fugindo de uma postura moral claramente preta ou branca e mergulhando na área acinzentada que, afinal de contas, abrange a maior parte dos conflitos e atitudes da raça humana. Seria muito fácil para Spielberg, como 'diretor judeu', assinar em baixo de todas as acções de Israel, mas, para seu crédito, não é isto que interessa a ele, mas sim retratar a situação extremamente complexa envolvendo a eterna luta entre israelenses e árabes pela ocupação da Palestina. Com isso, o cineasta cria um trabalho moralmente denso e politicamente ambicioso que, ao final de suas quase três horas de duração, faz com que o espectador saia da sala angustiado e emocionalmente esgotado. Exactamente como deveria ser, considerando-se o assunto abordado.
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E esta é, aliás, uma das principais discussões propostas por Munique: a partir de que instante uma acção com 'legitimidade' moral passa a ser condenável? Ou não há violência que seja justificável? E mais: se cada golpe desferido pelo inimigo for retribuído em intensidade maior, como este círculo vicioso poderá chegar ao fim? Aliás, não é verdade que Israel já bombardeara seus inimigos, causando a morte até mesmo de civis inocentes? Neste sentido, o massacre de Munique não poderia ser encarado já como uma retaliação? A verdade é que isso não interessa: a partir do momento em que o ciclo de violência tem início (algo que um personagem compara a um 'diálogo'), torna-se quase impossível interrompê-lo e é por isso que o título do filme surge em meio aos nomes de dezenas de outras cidades: em Munique ocorreu apenas um capítulo de uma história que já se passou (e ainda vai se passar) em várias localizações e o plano final do filme é perfeito ao exibir um símbolo indiscutível da continuidade desta brutalidade."
(...)
Mas o elemento mais nobre de Munique é seu esforço em tentar retratar as motivações dos activistas palestinos: em vez de tratá-los como terroristas frios e cruéis, Spielberg inclui uma cena que, apesar de implausível, serve para colocar Avner frente a frente com um integrante da Organização para a Libertação da Palestina (OLP). Na bela conversa que se segue, podemos compreender como a busca por um lar é incentivo suficiente para manter esta guerra sangrenta por décadas e décadas e como, no fundo, reflecte a própria trajectória pós-diáspora dos judeus até a fundação de Israel.
Protagonizado por um homem em conflito e cuja psique é destruída pela experiência de passar vários anos planejando a morte de outros seres humanos, Munique é um filme emocionalmente insatisfatório, mesmo frustrante. Mas, ao contrário do que podemos pensar inicialmente, esta frustração não é provocada porque não conseguimos estabelecer vínculos emocionais com o que está sendo narrado na tela, mas sim porque, em vez de nos identificarmos com o herói, de nos satisfazermos (ou não) com seus feitos, ficamos atordoados, angustiados e desesperançosos com relação ao mundo e à possível resolução de seus conflitos estúpidos e sangrentos.
Em outras palavras: o longa desperta, sim, vários sentimentos. A diferença é que estes não são os que normalmente poderíamos esperar como consequência de um filme de Steven Spielberg. "
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Zé Vieira (15-02-2006 - 11:10:12 PM) in:Forum EX