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SEMINTENDES

Lendo, vê Semintendes...

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SEMINTENDES

29
Dez06

«O umbigo da Ministra da Educação»

lamire

E. Prado Coelho *

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"O umbigo da Ministra da Educação deve ser tão GRANDE que não a deixa ver / ouvir opiniões diferentes da sua.
Há qualquer coisa que não está a funcionar bem no Ministério da Educação. Existe uma determinação em abstracto do que se deve fazer, mas compreensão muito escassa da realidade concreta. O que se passa com o ensino do Português e a aprendizagem dos textos literário é escandaloso.
Onde deveria haver sensibilidade, finura e inteligência na compreensão da literatura, há apenas testes de resposta múltipla completamente absurdos. Assim não há literatura que resista.
Há tempos, dei o exemplo da regulamentação por minutos e distâncias de determinadas provas. O ministério respondeu-me que se baseavam na mais actualizada bibliografia e que tinham tido reacções entusiásticas perante tão inovadoras medidas.
Não me convenceram minimamente. Trata-se de dispositivos ridículos e hilariantes, que provocam o mais elementar bom senso.

O problema reside em considerar os professores como meros funcionários públicos e colocá-los na escola em sumária situação de bombeiros prontos para ocorrer à sineta de alarme.
Mas a multiplicação de reuniões sobre tudo e mais alguma coisa não permite que o professor prossiga na sua formação científica.
Quando poderá ler, quando poderá trabalhar, quando poderá actualizar-se?
Não é certamente nas escolas que existem condições para isso.
Embora na faculdade eu tivesse um gabinete, sempre partilhado com mais quatro ou cinco pessoas, nunca consegui ler mais do que uma página seguida. Não existem condições de concentração.
Pelo caminho que as coisas estão a tomar, assistiremos a uma barbarização dos professores cada vez mais desmotivados, cuja única obsessão passa a ser defenderem-se dos insultos e dos inqualificáveis palavrões que ouvem à sua volta.
A escola transforma-se num espaço de batalha campal, com o apoio da demagogia dos paizinhos, que acham sempre que os seus filhos são angelicais cabeças louras.
E com a cumplicidade dos pedagogos do ministério.

Quando precisaríamos como de pão para a boca de um ensino sólido, estamos a criar uma escola tonta e insensata.
Nesta benemérita tarefa tem-se destacado o secretário de Estado Valter Lemos. É certo que a personagem se diz e desdiz, avança e volta atrás, com a maior das facilidades. Mas o caminho para onde parece querer avançar é o de uma hostilização e incompreensão sistemática da classe dos professores.
Com isto prejudica o país, e prejudica o Governo, com um primeiro-ministro determinado e competente, mas que não pode estar atento a todos os pormenores. E prejudica o PS, mas não sei se isto o preocupa.
Vem agora dizer que o professor deve avisar previamente que vai faltar, o que no limite significa que eu prevejo com alguns dias antecedência a dor de dentes ou a crise de fígado que vou ter.
E que deve dar o plano da aula que poria em prática caso estivesse em condições.
Donde, as matérias são totalmente independentes de quem as ensina, basta pegar no manual, e ala que se faz tarde.
Começa a tornar-se urgente uma remodelação do Governo, mas isso é tema delicado a que voltarei mais tarde."

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* Professor universitário

23
Dez06

Voto teológico de Natal

lamire

Agradecido pelo teu voto teológico de Natal.

De facto, o Templo e o Império, mais este que aquele, desviaram-se do que devia ser o seu objectivo primordial: o bom governo da cidade humana (pólis/política) e a criação da fraternidade/soridade local e universal.

O grande louvor de Deus não deveria reverter em Seu próprio favor (sacrifícios esfarrapadores do corpo, incensações, devocionismos...), mas em favor da humanidade. É esta a mensagem que ressalta do coração do essencial bíblico:" A minha alegria é habitar com os filhos dos homens" (Sab.); "Chamar-se-á Emanuel, isto é Deus connosco"; e a sequência do que costumo chamar a ´última vontade` de Jesus o Cristo, expressa e exemplicada com gestos, imediatamente antes da Sua morte: as chamadas ´obras de misericórdia` ("Vinde benditos de Meu Pai, porque tive fome..."), apresentadas por Mateus (Mt 25, 31-46, imediatamente antes da narração dos acontecimentos da Última Ceia e Paixão. Tudo como que para vincar e gravar bem na memória e agir dos apóstolos o essencial da sua mensagem libertadora, pela qual incarnou e se sujeitou à humana condição de mortal, com morte na cruz fruto das suas denúncias ao Templo e ao Império, pelo que eles representavam de anti-humanidade.

Contra eles, só será eficaz a prática pelos humanos do metafórico lava-pés: "Também vós vos deveis lavar os pés uns aos outros" (não hierarquia, mas diaconia, serviço); o redundantemente repisado "Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis... É por isto que todos saberão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros"; e a fracção do pão e do vinho, com o conclusivo "Fazei isto (tudo) em Minha memória." E o que fazem o Império e, tantas vezes, o Templo? Só nos deixam respirar na medida dos seus interesses.

Duas em cada três pessoas ainda morrem, vergonhosa e pecaminosamente para o mundo actual, de má nutrição e fome, associadas a outras faltas de condições de vida humana digna. Jesus não nos pediu e pede revolução social por métodos violentos, mas sim conversão, ´metanóia`, ou seja uma mente nova capaz de nos fazer arrepiar caminho da nossa maneira egoísta e material de viver a vida em todas as suas dimensões.

É verdade que Ele cumpria as práticas religiosas e políticas do Seu tempo (circuncisão, ida anual ao Templo onde até se perdeu, presença aos Sábados nas Sinagogas com papel de presidente da Assembleia, o pagamento do tributo a César …), mas passou além destes rituais tentando pô-los ao serviço das pessoas: "O Espírito do Senhor está sobre Mim, porque Me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-Me para anunciar a libertação aos cativos e, aos cegos, o recuperar da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar um ano de graça do Senhor. (…) Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura, que acabais de ouvir" (Lc. 4, 18-21). Por isso, denunciou a toda a subserviência e menoridade humana permitida ou exigida pelos responsáveis religiosos ou políticos, por grupos ou pessoas particulares. Proclamou, junto da Samaritana, que "os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai em espírito e verdade, …sem ser forçosamente neste monte nem em Jerusalém", pois o Templo só terá razão de existir enquanto espaço de reflexão e união de esforços para concretizar os caminhos do Amor igualitário que Ele proclamou, com e desde o início da Sua vida.

Assim, destruir o Templo? Não.

Mas converter à causa da humanidade, como impulsionadores do Espírito de Amor, a sua hierarquia e os seus frequentadores, sim. Penso que, só neste Espírito, terá também fundamento a construção do Barracão da Cultura. Caso contrário, será mais uma infra-estrutura material, que se multiplicará aqui e acolá, conforme o número e a necessidade dos aderentes, ao serviço de uma causa humano-religiosa.

E este é o risco!

Pois lá cairão por terra muitos dos argumentos até agora convictamente apresentados, pelo amigo, em favor de uma vivência-outra da mensagem jesuânica. Eles provocarão o aparecimento de uma nova hierarquia proprietária e mandadora dos Barracões, a exibição de ´líderes` com maior facilidade para o verbo e actuação cénica, o recurso ao dinheiro ou bens dos pobres para a sua construção, etc.

Em que será isto diferente, exceptuando a escala de dimensão, aos outros templos cristãos, igrejas e santuários, tantas vezes criticados? Não consta que Jesus, o Nazareno, tenha mandado construir qualquer infra-estrutura material para o anúncio e prática da Sua mensagem libertadora e salvífica. Aproveitou os espaços físicos que o seu tempo lhe proporcionava e, sobretudo, o grande espaço divino do coração das pessoas e da natureza.

Dispomos hoje de idênticos espaços; de maior facilidade no anúncio da mensagem mediante a utilização das novas técnicas de comunicação; de melhores ocasiões para o testemunho e vivência da mensagem pois, apesar do ser humano ser hoje mais social do que nunca, o seu coração de pedra é capaz de provocar as maiores situações de injustiça e de indignidade da vida humana.

...

Fernando Neves

12
Dez06

Além-Mar edita livro de José Dias da Silva

lamire

Notícia da apresentação do Livro  ---- 

Pelas 18:30 de hoje, no seminário dos Missionários Combonianos em Coimbra, José Dias da Silva, apresentou publicamente o seu novo livro, Memórias de um tempo futuro, com edição da revista Além-Mar, com a qual o autor colabora.

O livro apresenta-nos várias das crónicas publicadas na  referida revista missionária ou no Jornal Correio de Coimbra, divididas em 4 capítulos - Aquilo em que acredito - Deus que ama o mundo - A Igreja peregrina a caminho do reino - Um mundo a construir à medida da pessoa.

 Encerra com  o epílogo - Imaginação precisa-se.

O livro tem apresentação de Manuela Silva e capa de "Terra das Ideias".

A capela do seminário foi o local escolhido para esta cerimónia, à qual assistiram muitos dos seus amigos, incluindo as principais entidades religiosas da cidade, o sr. Bispo D. Albino Cleto e também o Padre Provincional das Missões Combonianas.

De referir a presença de sua mãe Dona Lucinda Dias.

Depois de aberta a sessão foi a vez do Director do Correio de Coimbra, Dr. António Jesus Ramos, apresentar o autor. Centrando a sua alocução na ideia de que José Dias, como um homem bom, não necessita apresentação. No entanto, sendo conterrâneo do autor, e numa expressão  poética, tão característica de Jesus Ramos, foi passando uma visão sobre o passado do autor, desde que nasceu, em Souto do Brejo.

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Biografia incluída no Livro:

José Dias da Silva nasceu a 15 de Março de 1942, no Souto de Brejo, Pampilhosa da Serra. É casado e tem dois filhos.
Frequentou durante oito anos os seminários da diocese de Coimbra.
Licenciou-se em Físico-Químicas pela Universidade de Coimbra. Assis­tente do Departamento de Química da Universidade de Coimbra e investi­gador em Química de produtos naturais e em Química Teórica, procurou contribuir para a construção de uma sociedade mais justa, mais solidária e mais humana. Reformou-se ao fim de vinte anos de serviço para se poder dedicar melhor às responsabilidades familiares e a tarefas eclesiais e sociais.
É membro da Comissão Nacional Justiça e Paz, da Comissão Coorde­nadora Nacional das Semanas Sociais, da Comissão Permanente do Conselho Pastoral Diocesano de Coimbra e da Comissão do Conselho Pastoral da Paróquia de São José (Coimbra). É também o responsável pelo módulo de Doutrina Social da Igreja na Escola de Leigos da diocese de Coimbra e orienta mini cursos sobre a matéria em paróquias, movimen­tos e grupos de reflexão.
Publicou o livro Viver o Evangelho Servindo a Pessoa e a Sociedade - Introdução à Doutrina Social da Igreja.
Assina as colunas «Fé e Compromisso», no Correio de Coimbra; «O Futuro Depende de Nós», no Notícias de Vila Real; «Sinais», na revista Além-Mar e «Pedra a Pedra», no Mensageiro de Santo António. Também colabora com Estudos Teológicos, revista do ISET de Coimbra.

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Seguiu-se a apresentação do livro pelo Prof. José Vieira Lourenço, a qual está disponível nesta página:

Apresentação do Livro Memórias de um tempo futuro, por José Vieira Lourenço.

José Dias da Silva, o autor, foi o orador seguinte. Referenciando a sua vivência como colaborador da Igreja, indica-nos que iniciou as suas crónicas a 8 de dezembro de 1983, no Correio de Coimbra. Procura  fazer-nos ver que se cada um modificar um pouco  na sociedade, todos juntos faremos uma grande transformação. Fala do mundo actual e intitula-se um "pessimista local, mas optimista global".

A sua alocução poderá ser lida posteriormente no seu blog Fé e Compromisso.

Encerrou esta apresentação D. Albino Cleto, Bispo de Coimbra, que enalteceu toda a colaboração de José Dias, registando que o autor é o exemplo do que a Igreja pretende dos leigos, face a todas as dificuldades da vida actual , que também se refletem na Igreja.

José Dias da Silva passou depois a autografar os livros de todos aqueles compareceram a esta cerimónia.

Seguiu-se um Porto de Honra oferecido pela comunidade Comboniana a todos os presentes .

Outras observações:

Consulte: OUTRA IDADE 

12
Dez06

José Vieira apresenta livro de José Dias

lamire

Memórias de um tempo futuro

Quando recebi o telefonema do Zé Dias a convidar-me para fazer a apresentação deste seu livro Memórias de um Tempo Futuro, a minha resposta foi imediatamente afirmativa. O Zé Dias é alguém que eu conheço há muitos anos, desde os bons tempos da nossa juventude em que até  jogámos futebol juntos, e é alguem por quem sempre tive e tenho uma admiração muito especial. Por isso e por tudo o mais que escuso de dizer porque me parece óbvio, eu só poderia aceitar este desafio.
Estas Memórias de um Tempo Futuro em boa hora editadas pela editorial Além Mar, são constituídas por quatro  blocos temáticos e por um epílogo e ainda por uma  breve apresentação do livro  a cargo de Manuela Silva, que nos apresenta o Zé Dias  como um lúcido  profeta do nosso tempo.
Que o Zé Dias  é um profeta do nosso tempo, todos o reconhecemos e aceitamos certamente, uma vez que a maior parte de nós acompanha  a sua obra, lê as suas crónicas. E que o Zé é um homem lúcido também não temos dúvidas. Alías o étimo latino lucidu significa precisamente aquilo que o Zé Dias é nas  prosas com que nos brinda: lúcido porque tem luz, lúcido porque brilha, lúcido porque é cintilante e lúcido ainda porque é claro nos seus juízos, nos seus raciocínios e na sua argumentação.
 
Embora o livro esteja dividido nos tais quatro blocos temáticos que já referi, gostaria no entanto de  apresentrar a obra  sem  qualquer preocupação sequencial, optando antes por defender que a obra é o espelho de um homem de fé, o espelho dum homem atento à família, o espelho de um homem  atento à Igreja e  o espelho de um homem atento à sua cidade e atento ao Mundo.
 
Que o Zé Dias é um homem de fé todos o sabemos e não será por acaso que esta obra começa precisamente com este título: Aquilo em que acredito, uma síntese do Credo dos apóstolos. Também não será por acaso que o artigo seguinte se intitula Onde está o teu irmão?. É que o Zé, ao longo da sua vida, levou sempre muito a peito a conhecida frase evangélica “amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração,  com toda a tua alma e com toda a tua mente” mas sem esquecer que o segundo mandamento é semelhnte a este: “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo”  (Mt. 22,37 e 39), e sem esquecer também que “se alguém disser: eu amo a Deus, mas odiar o seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama a seu irmão, ao qual vê, como pode amar a Deus, que não vê?” (1ª Carta de João, 4, 20).
 
Qualquer um de nós aceita facilmente que o Zé Dias se afirme como homem de fé,  que coloca no mesmo plano este  amor a Deus e este  amor ao próximo. No entanto nem todos por vezes o entenderam assim e por causa disso mesmo ele sentiu-se obrigado a esclarecer as Razões (do seu) Compromisso. De facto em Março de 1995, o Zé publicou no Correio de Coimbra um dos textos  mais fortes desta colectânea em que procurou precisamente justificar a sua coluna, alvo de crítica  de alguns leitores.  Torna-se dificil ( mas ao mesmo tempo talvez sejá fácil, passe a contradição ) adivinhar as críticas que o Zé recebeu. Mas o conjunto de citações bíblicas que apresenta nesse escrito  fundamentam com clareza a radicalidade da proposta de Jesus Cristo, a mais libertadora das propostas que nos obriga à desinstalação permanente! “Sinto uma obrigação, uma violência interior que me obriga, quase como uma dor física, a ter de lutar por isso. E eu bem queria recusar: como eu gostaria de estar sossegadinho no meu canto, sem chatear ninguém!” (p.16).
 
Só um homem de uma fé muito profunda seria capaz de nos dar conta dos seus acidentes de percurso (tílulo do artigo de Março de 2006, p. 27) nesta estrada que o conduz à plenitude do reino de Deus.  Sem qualquer complexo, mas escudado na sua fé, o Zé  fala-nos dos seus graves problemas de saúde, invocando três palavras bíblicas: o exemplo de  Job, a sábia carta de S. Paulo e o momento do  Jardim das Oliveiras, momento inspirador supremo. E por isso declara: “…não pedi a Deus que me curasse, mas que me desse forças para aceitar sem revolta a sua vontade. A oração não tem de ser só petição nem uma tentativa de alterar a vontadce de Deus, menos ainda uma espécie de cunha que pode raiar o suborno.” (p 30).
 
            Quen conhece o Zé, sabe também que ele é um homem que ama profundamente a sua família. Que fala dela com orgulho. Com carinho. Com uma admiração profunda. Por isso não nos podem espantar as referências  feitas à Fátima, à Renata e ao David.
 Como podia o Zé esconder a alegria de ser pai pela segunda vez, depois de onze anos de espera? Como podia o Zé calar a sua alegria perante aquele David, bocadinho de gente, fruto de uma gravidez difícil, que a Fátima suportou, certa de que o amor de Deus os queria brindar com mais este encargo e com esta alegria? (p.23).
Como podia o Zé calar a alegria da profissão de fé da Renata, apesar da invasão dos fotógrafos quase comparável à invasão dos bárbaros?(p.25)
 
Que o Zé é um homem atento à igreja só não vê quem não quer. Diria, em primeiro, que não é vulgar que alguém pense em reformar-se após vinte anos de serviço, para estar mais disponível para a família e para a Igreja. Mas o Zé fez isso. E a sua disponibilidade para servir a Igreja é de todos conhecida.  Não vale a pena recordar aqui, até porque não seria capaz de o fazer com rigor, toda a colaboração que o Zé Dias tem prestado particularmente à Igreja Diocesana de Coimbra e à Igeja Portuguesa em geral.
Direi apenas que esta atenção à Igreja é bem vísivel na maior parte dos artigos com que nos brinda e por isso deixo apenas breves referências.
Em Outubro de 2002, 40 anos passados do Vaticano II o Zé interroga-se: “Realizar um Vaticano III? Concretizar o Vaticano II ainda cheio de virtualidades? O mais importante é que bispos, padres, religiosos e leigos queiramos uma Igreja capaz de responder aos desafios de hoje, estejamos disponíveis para testemunhar Jesus Cristo aqui e agora, estejamos abertos às exigências do espírito  das bem–aventuranças, queiramos mudar de vida. Sem isto podem vir concílios, sínodos, planos pastorais que nada ou pouco mudará, porque a mudança tem de começar dentro de cada um dos que formam a igreja.” (p. 63).
 
Para o Zé Dias, uma Igreja que queira responder aos desafios de hoje não pode deixar de lado metade da humanidade. E por isso ele defende (cfr. P.124, Além–Mar, Jul.Ago.  2005) que é tempo de a Igreja olhar para a mulher doutra forma, dando-lhe o papel que ela merece em plena igualdade com o homem.  Por isso, declara que é   “ tempo de  a metade da humanidade que precisa de ser salva comece por salvar a mulher, assumindo que ela tem de ter os mesmos direitos e deveres e acabando com legislações cívicas ou religiosas que só a mantêm num estado de menoridade e de incapacidade de nos salvar a todos.” (p.124)
 
Uma Igreja capaz de responder aos desafios de hoje tem de ser uma Igreja com cada vez mais preocupações de carácter ecuménico e com a dignidade da pessoa humana. E daí a evocação que o Zé faz em 2005 de duas encíclicas de João Paulo II a Redemptor Hominis e a  Christifideles Laici (p.68).
 
Disse anteriormente, que o Zé é também o espelho de um homemn atento à sua cidade. Em Junho de 1989, a caminho da maternidade, por altura do nascimento do David, o Zé dá conta dos efeitos da construção desenfreada que não foi capaz de construir um passeio panorâmico numa zona da cidade onde estava projectado, provavelmente porque o poder do cifrão falou muito mais alto do que o poder estético e contemplativo. (p. 24). O mais grave, conclui o Zé, não é o império do betão. O mais grave é que nós os cidadãos desta Coimbra  ficamos de braços cruzados perante  estes bárbaros insensíveis. Ficámos na altura e ficamos hoje, porque a insensibilidade a este nível continua e o tal  império do betão continua a sobrepôr-se ao império dos espaços verdes.
 
Mas o Zé Dias é sobretudo um cidadão atento ao nosso mundo, que procura fazer a exegese dos acontecimentos e decifrar os sinais, procurando sempre encontar aquela necessária réstea de esperança cristã, inspirado quer nos ensinamentos bíblicos quer nos documentos conciliares ou nas encíclicas papais.
Cristão comprometido com o seu tempo e no seu tempo, o Zé não passa à margem dos acontecimentos. E por isso  fala dessa vergonha universal que foi o holocausto nazi a propósito dos 50 anos do Estado de Israel. Fala de uma sociedade em crescente relativismo ético que de repente acorda acossada com o fenómeno Le Pen, ou duma França que questiona o seu “Modelo Social Humano” por causa dos distúrbios juvenis em Paris. Fala da necessidade de continuarmos a lutar prioritariamente pela paz a propósito da invasão do Kuawait pelo Iraque. Fala duma “Solidariedade por Impulsos” (p. 113) que procurou responder às ondas assassinas do tsunami que varreu o Sudeste Asiático em 26 de Dezembro de 2004.
 
Cidadão atento, O Zé é sobretudo um cidadão inconformado, para quem a pobreza, esse crime contra a humanidade (p.135), não é inevitável (p.101) uma vez que “a Terra foi dada a todos e não apenas a alguns”. (p.104) Daí que se interrogue, tal como o fizera João Paulo II: “ Como é possível que ainda haja, no nosso tempo, quem morra  de fome, quem esteja condenado ao analfabetismo, quem viva privado dos cuidaos médicos mais elementares, quem não tenha uma casa onde abrigar-se?” (Novo Millennio Ineunte, p. 104). Mas além das interrogações, o  Zé Dias lança algumas propostas concretas, novas atitudes relativamente à pobreza. E assim, convida-nos, em primeiro lugar , a passar da indiferença à compaixão; depois convida-nos a passar da culpabilização do pobre para a responsabilização da sociedade e finalmente sugere que passemos da lógica da esmola à lógica do direito. (Cfr. 133-136; Crime Contra a Humanidade, Alé–Mar, Jan. 2006).
Profeta lúcido, o Zé Dias denuncia  as “Novas Escravaturas” (p.109) que ainda hoje  roubam a liberdade a milhões de homens, mulheres e crianças, vítimas de tráfico para exploração pelo trabalho escravizado ou vítimas de exploração sexual e declara que não entende (e nós também não!) como é que “ a humanidade, que se tornou capaz de colocar homens na Lua e de enviar mensagens para lá do sistema solar, tem ainda tanta dificuldade para chegar ao coração de cada pessoa”. (p.112)
Profeta  e cidadão empenhado e comprometido o Zé Dias celebra os  30 anos da Revolução de Abril desejando que a nossa sociedade retome os seus ideias libertadores: a democracia, a paz social e a paz entre todos os povos, a igualdade da mulher, o apoio persistente e digno aos colectivos marginalizados e excluídos, uma melhor redistribuição da riqueza nacional, uma melhor saúde, um melhor ensino, uma melhor justiça para todos. (Cumprir Abril, p.154).
Qualquer um de nós poderá com certeza subscrever estes desejos do Zé Dias. Mas  não será por acaso que ele escolheu para epílogo da sua obra “Imaginação Precisa-se”(p.161). De facto mais do que nunca a construção dos novos céus e da nova terra nos  exige cada vez mais essa imaginação. 
Não sei se consegui motivar-vos para a leitura desta obra que é um permanente apelo e um constante desafio. Mas eu creio que o Zé, como o poeta, têm razão: tenhamos saudades do futuro!
 
J. Vieira Lourenço
 Seminário dos Combonianos, Coimbra, 12 de Dezembro, 2006
10
Dez06

A vida do Professor

lamire

Acabo de acordar, depois de uma noite pouco e mal dormida, pois saí ontem, após um dia de trabalho lectivo, de uma reunião do Conselho Pedagógico, com início às 17:45 e fim às 23: 55 horas. Estes Conselhos Pedagógicos ou ´Apedagógicos`, a ritmo de 2 ou 3 por mês, são quase só um gasto inútil de tempo e energias para tentar pôr em prática uma legislação platónica, elaborada por mentes quiméricas que vivem no puro mundo das essências cognoscitivas, não sendo capazes de apresentar nenhum modelo concreto das "aberrações" que vomitam cá para fora, agora já não em papel, (a não ser que seja, em primeira mão, na Imprensa para uma operação de charme e surpresa dos professores), mas via o tal "choque informático".

Exemplificaria com o caso da famosa TLEBS – que é outro que tal ! – e da sua aplicação. As escolas – e não só - têm andado à nora com   tamanha aberração filosófico-abstracto-subjectiva de linguistas iluminados que não conhecem a pouca capacidade dos alunos do Ensino Básico para tão altos voos de abstracção, resultando depois numa queda livre ao nível das competências essenciais da comunicação oral e escrita ou até mesmo da simples leitura e compreensão dos textos da sua língua materna.

O caso é que quisemos inteirar-nos das novas terminologias e, a princípio, só na Internet apareciam algumas coisas, mas contraditórias entre si, até que, em certa altura, a DGIC (Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular ou diarreia geral intelectual da comunicação?) informa quais os anos de ensino que, no presente ano lectivo entrariam na TLEBS, mas sem fornecer um programa concreto para cada nível de ensino. Muitas consultas pessoais e telefónicas à DREC, que, de concreto, nunca nos soube dizer nada, defendendo-se conforme podia.

Ora, o ano lectivo já vai avançado! E não é que, a fazer fé no que o senhor Secretário de Estado disse ao ´Expresso` numa entrevista publicada em meados de Novembro, a TLEBS só se aplica este ano lectivo nas escolas-piloto, devendo depois ser feita uma avaliação, da qual poderá sair como resultado que a TLEBS ficará muito bem arquivada lá no arcaboiço de onde, nunca por nunca ser, devia ter saído?

Ó meus amigos, mail para a DREC a solicitar que consulte o referido senhor para saber como é que é, se devemos ou não implementar a TLEBS, pois que a nossa não é uma escola-piloto. Resposta, quase imediata, da DREC informando que não dispõe de elementos para nos dar uma resposta e, por conseguinte, que iria consultar a DGIC, que não foi a quem nós solicitámos que a questão fosse posta.

E o Plano Nacional de Leitura? Esteve a senhora Ministra do ME na TV com outras personagens nele implicadas, a pintar tudo muito cor-de-rosa, quase fantasmagórico, mas na nossa escola, por falta de recursos humanos,  a pobre Biblioteca Escolar que temos tem estado fechada, quase desde o início do ano. E pretendendo concorrer à Rede Nacional de Bibliotecas Escolares, o caso está pardo porque, apesar de ser um edifício novo, parece não ter as dimensões exigidas.

Quanto ao Plano de Acção para a Matemática, disciplina de que se tem feito tanto sururu,  apesar do trabalho realizado pelos professores para a respectiva candidatura, chega a resposta dois meses depois,  só a acusar a recepção. Mais tarde, chega a tesoura económica dificultando a aplicação e o desenvolvimento do mesmo.

Quanto a efeitos didáctico-pedagógicos de formação, educação e instrução dos alunos, a legislação ultimamente produzida têm valor quase nulo. Agora, aumentar a burocracia e desgastar física e psicologicamente os trabalhadores da educação, nisso sim, conseguem ser arrasadores. É o que noto nos rostos e nas conversas da sala de professores do meu agrupamento de escolas, onde se anda à beira de uma crise geral de nervos.

O professor perdeu quase toda a sua 'autoridade` e uma grande parte dos alunos (quem sabe se apoiados por encarregados de educação impados dos seus novos poderes - "perdi os professores, mas ganhei a população"- ) passeia as mochilas pela escola, convive pouco educada e pacificamente e ´estão-se marimbando`   para o ensino-aprendizagem das aulas e os comportamentos de boa educação que os docentes lhes tentam incutir.

Acordo, hoje, bem de manhã, para iniciar novo dia de trabalho e o que ouço logo nas primeiras notícias da rádio? "54.000 neolicenciados no desemprego."

Afinal para quê adquirir conhecimentos, cultura,  competências (palavra hoje tão do gosto do ME) ? Para isto?! …

Para chegarem ao mundo de trabalho e serem rejeitados, em detrimento de outros com menos habilitação, mas que saem mais baratos aos serviços do estado, da indústria e do comércio? De outros que já entraram dez anos mais cedo que eles na vida activa? E eles que até cerca dos 25 anos viveram à custa dos pais e, agora, com um canudo de competências nas mãos, continuam a ter o mesmo triste fado?

Comecei então a sentir uma revolta muito grande cá por dentro por, enquanto professor, pensar ter sido um elo contribuinte da cadeia irisante que, ultimamente, tem, qual droga, conduzido alunos até à porta das Universidades e outros estabelecimentos de Ensino Superior.

E, já na minha escola, chorei por dentro, gritei para fora com todas as forças da minha alma, em convulsão nervosa, tão grande indignidade e os disparates que os governantes do meu país, que viveu um grandioso 25 de Abril com o ideal de "Paz, pão, habitação, educação, saúde" para todos, têm feito para chegarmos a este estado de coisas.

 E, por isso, logicamente, vejo-me agora obrigado a dizer: "Deixem-se de cantigas! Deixem trabalhar os adolescentes, enquanto é tempo de criar bons hábitos! Dê-se-lhes mais trabalho e menos escola, porque para a grande maioria deles, da escola enquanto instituição com a finalidade que tem, estão fartos dela até à ponta dos cabelos."

Fernando Neves

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